1º Encontro Nacional de Castanheiras e Castanheiros mobiliza 68 organizações comunitárias e reforça aliança dos povos da floresta

1º Encontro Nacional de Castanheiras e CastanheirosColetivo da CastanhaENCC
Em um acontecimento que entrará para a história de castanheiras e castanheiros de toda a Amazônia, a aliança dos povos da floresta foi reforçada nesta semana, em Manaus. O 1º Encontro Nacional de Castanheiras e Castanheiros reuniu durante 3 dias representantes de 34 organizações extrativistas, 32 organizações indígenas e 2 organizações quilombolas de 61 áreas protegidas dos 7 estados produtores para discutir os problemas e obstáculos vivenciados pela base da cadeia de valor da castanha-da-amazônia e criar formas de se organizar coletivamente para enfrentá-los.

Comércio e preço justo, criação de redes de comercialização, integridade territorial, representatividade para incidência política e valorização da identidade castanheira e extrativista foram pautas quentes do encontro. O caldeirão diverso de histórias e vivências deixou claro para todos os presentes que, juntas, as mais de 70 organizações comunitárias que compõe o Coletivo da Castanha unidas aos parceiros da sociedade civil organizada e às representações do movimento social têm força e poder para lutar por seus direitos e transformar a realidade.

“Tenho certeza que estamos fazendo aqui o que foi feito em março de 1989, fortalecendo a aliança dos povos da floresta”, disse Júlio Barbosa, presidente do Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), lembrando da histórica aliança liderada por Chico Mendes que promoveu a defesa dos territórios indígenas
e impulsionou a criação das Reservas Extrativistas.

Para André Tomasi, coordenador do IEB e membro da secretaria-executiva do Observatório Castanha-da-Amazônia (OCA), o encontro é só o começo de uma união coletiva.

“Esse é um momento dos povos se unirem. Aqui estamos falando de castanha, mas no fundo no fundo estamos falando dos povos, das pessoas e nos organizando pra gente lutar pelo que a gente quer”.
Edinho Macuxi, coordenador-geral do Conselho Indígena de Roraima (CIR), seguiu a mesma linha, já indicando os caminhos para a luta.

“Ninguém é obrigado a viver preso às regras do sistema. Se existe um direito, ele tem que ser efetivado e respeitado. E se não existe, temos que fazer o direito. E se não existe lei pra regulamentar, a gente precisa criar lei elegendo nossos representantes”

Silvia Elena, secretária de Direitos Humanos do CNS também reforçou a importância do encontro e do Coletivo para transformar a realidade de forma a proteger os territórios dos povos produtores de castanha.

"A gente precisa defender o nosso território para garantir que a nossa castanha siga existindo. Esse encontro serve para a gente se organizar e, não só enfrentar os desmontes das políticas públicas que apoiam o extrativista, mas também propor soluções".

Em cada canto do encontro se viam e ouviam articulações e trocas de experiência. Indígenas, quilombolas, extrativistas, ribeirinhos arquitetando novas ideias e dando forma a novas parcerias.

A juventude reunida para pensar como seguir conectada e ativa. A velha guarda contando suas trajetórias e aprendizados pelo caminho. Lideranças trocando ideias sobre comercialização e articulando vendas coletivas. As cabeças políticas planejando os caminhos para pleitear a valorização do trabalho extrativista. Mulheres castanheiras se unindo para reivindicar reconhecimento e visibilidade.

“Se vocês notarem, nós mulheres raramente somos tratadas como castanheiras. É sempre os castanheiros. Não temos essa visibilidade apesar de sermos castanheiras também. Saímos de casa junto com os homens, fazemos a coleta, aplicamos as boas práticas e não somos reconhecidas”, apontou Shirlei Arara, liderança da TI Igarapé Lourdes, em Rondônia, antes de convocar todas as castanheiras presentes para subirem ao palco.

Raquel Sampaio, a Cacau, da Acaje, no Pará, aproveitou para reforçar que o lugar da mulher é onde ela quiser.

“O que quero dizer é que sou extrativista sim, com orgulho, faço parte de uma diretoria que briga mesmo pelo direito do extrativista. A gente não tem medo. Não tem!”

Debaixo de aplausos, Cacau contou o dia a dia da mulher extrativista. “A gente comboia mesmo. Coleta, quebra, carrega duas sacas pela mata e não é pouca coisa não. É coisa de seis, sete quilômetros carregando castanha. Pense!”

O 1º ENCONTRO NACIONAL DE CASTANHEIRAS E CASTANHEIROS

A programação do 1º Encontro Nacional de Castanheiras e Castanheiros foi dividida em 3 momentos. No 1º dia, “Quem somos e de onde viemos”, um visão geral de quem estava presente, com apresentações dos participantes, mapeamento dos territórios representados e duas mesas para tratar da Identidade Castanheira e das Conquistas do Movimento Social e dos Povos da Floresta.
No segundo dia, o tema foi “Onde estamos”. Pela manhã, mesas sobre conjuntura política e econômica e sobre o que está acontecendo de bom para as economias da sociobiodiversidade. À tarde, atividades práticas, com seis oficinas de temas diferentes, promovidas pelos participantes ou pelas organizações de apoio: Direitos Humanos e Proteção Territorial; Fluxo de Caixa e gestão financeira de organizações comunitárias; Boas Práticas, Classificação e Parâmetros de Qualidade; Financiamento; Castanhadora, a calculadora do castanheiro e Mapeamento de Castanhais.

No terceiro e último dia, apresentações de exemplos de sucesso na cadeia da castanha, debates sobre o mercado de castanha-da-amazônia e como o Coletivo da Castanha pode se organizar para promover mais informação colaborativamente e se articular por um comércio mais justo e ético. Na sequência, uma dinâmica para que todos os participantes pudessem trazer ideias e demandas sobre os caminhos que o Coletivo da Castanha deve seguir. Foram seis temas tratados: identidade do Coletivo, regimento interno, organização para tomada de decisões e diálogo com tomadores de decisão, qualidade de vida e direitos humanos, relação com o mercado e monitoramento de informações econômicas.

“A gente que está nesse contexto fazendo a coleta, o beneficiamento, a comercialização, acaba não percebendo o benefício socioambiental que a gente traz. Estando nas unidades de conservação, temos um papel fundamental, vivendo e protegendo essas regiões”, disse Bruno Dutra, da Cooperativa Mista dos Produtores Extrativistas do Rio Iratapuru (Comaru), do Amapá.

“Às vezes a gente pensa que está vendendo castanha, mas a gente está vendendo história, vendendo sonho. O Coletivo da Castanha serve para nos unirmos, encontrarmos oportunidades e o momento é esse pra fortalecer não só o Coletivo, mas todos aqueles que o compõe”, completou.

Para encerrar o encontro, a leitura da Carta do 1º Encontro Nacional de Castanheiras e Castanheiros mostrou a representatividade do Coletivo, a representatividade da cadeia de valor da castanha, os problemas e ameaças enfrentados pela base produtiva e as demandas para a garantia da valorização do trabalho extrativista e da qualidade de vida das populações que trabalham com castanha. A carta será publicada na próxima semana e entregue para autoridades públicas e tomadores de decisão.

O OCA E O COLETIVO DA CASTANHA

O 1º Encontro Nacional de Castanheiras e Castanheiros foi promovido pelo Coletivo da Castanha e pelo Observatório Castanha-da-Amazônia (OCA) em parceria com uma série de organizações da sociedade civil, movimento social e organizações de base comunitária produtoras de castanha-da-amazônia.

O Coletivo da Castanha é uma rede com mais de 150 extrativistas de mais de 70 organizações comunitárias que trabalham com castanha-da-amazônia, cobrindo todos os sete estados produtores. O Coletivo realiza o monitoramento participativo de preços das safras de castanha desde 2017.

O Coletivo é organizado pelo OCA, uma rede de organizações que tem como missão produzir conhecimento e inteligência, além de mobilizar os diversos atores da cadeia de valor para consolidar um mercado justo, que valorize os povos, populações e comunidades envolvidas ao mesmo tempo em que promove a conservação da floresta.


O 1º Encontro Nacional de Castanheiras e Castanheiros teve apoio do (1) projeto Bioeconomia e Cadeias de Valor, desenvolvido no âmbito da Cooperação Brasil-Alemanha para o Desenvolvimento Sustentável, por meio da parceria entre o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e a Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit (GIZ) GmbH, com apoio do Ministério Federal da Cooperação Econômica e do Desenvolvimento (BMZ) da Alemanha; (2) da Aliança pelo Clima e Uso da Terra (CLUA); e (3) da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional – USAID.

 


Texto: Adriano Maneo
Fotos: Adriano Maneo, Rodrigo Duarte e Thiago Araújo